Cecília Meireles uma referência da nossa literatura e da poesia

Estou aqui, mais uma vez, para falar de poesia. E falar de poesia no Brasil é ter um vasto material a sua disposição, pois a quantidade de grandes poetas que nosso país já produziu é fantástica. Isso também cria uma dificuldade, pois é preciso escolher somente um nome, não se pode falar de todos ao mesmo tempo, é necessário falar de cada um separadamente, para que possamos apreciar as obras maravilhosas que eles produziram ao longo do tempo e suas histórias de vida.
Por isso, hoje vamos falar de uma poeta, sim, isso mesmo, ela não gostava de ser chamada de poetisa, então vamos falar de uma poeta, que foi a primeira mulher a conquistar um grande espaço na literatura brasileira, mostrando um talento fantástico. Ela estrou muito nova na literatura, publicou seu primeiro livro aos 18 anos e deixou um legado de mais de 50 obras produzidas.
Seu nome se tornou referência na cultura brasileira, chegando a batizar uma sala de concertos no Rio de Janeiro. Hoje vamos conhecer um pouco mais sobre a vida e a obra da poeta, professora, jornalista, pintora e tradutora Cecília Meireles.

As perdas de Cecília

Cecília Benevides de Carvalho Meireles nasceu em sete de novembro de 1901, na cidade do Rio de Janeiro. A vida da família foi muito dramática nesse período, quando ela nasceu seus pais, Carlos Alberto de Carvalho Meireles e Mathilde Benevides Meireles, haviam perdido três filhos. Três meses antes de Cecília nascer seu pai faleceu. Quando a menina estava com apenas três anos de idade perdeu a mãe. Cecília, então, foi criada pela avó materna, Jacinta Garcia Benevides, a única parente próxima que lhe restou.
A menina, desde muito nova, mostrava um grande interesse pelos livros. Aos nove anos, em 1910, quando estudava na Escola Municipal Estácio de Sá, ganhou uma medalha de ouro pelo excelente desempenho escolar. Um detalhe, recebeu a medalha das mãos de ninguém menos do que o poeta Olavo Bilac, que era inspetor da escola. Nessa época Cecília rabiscaria seus primeiros versos. Ela também demonstrou muito interesse pela música, chegando a ter aulas de canto, violão e violino.

Professora e poeta

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Com 16 anos, em 1917, formou-se professora pela Escola Normal do Distrito Federal, onde estudou, entre outros, com o poeta Osório Duque-Estrada, a escritora Alexina Magalhães Pinto e o historiador Basílio Magalhães. Na formatura foi escolhida como oradora da turma. Dois anos depois lançaria seu primeiro livro “Espectros”, um apanhado de 17 sonetos, que marcaria o início de uma das mais brilhantes carreiras da literatura brasileira.
Em 1918 foi nomeada professora adjunta do curso primário em uma escola pública.
O ano de 1922 marca o seu casamento com o pintor, desenhista, ilustrador e artista plástico português Fernando Correia Dias, que com Cecília teria três filhas, Maria Elvira, Maria Mathilde e Maria Fernanda.
Em 1923, dentro da linha pedagógica, publicou o livro infantil “Criança, Meu Amor”, com prosas para o ensino fundamental. No mesmo ano lançaria mais dois livros de poesia “Nunca Mais’ e “Poema dos Poemas’. Ainda na década de 1920 participaria do grupo da revista Festa, um grupo de poetas que defendia a manutenção de certos valores tradicionais da poesia. Faziam parte do grupo, além de Cecília, Tasso Silveira, José Cândido de Andrade Muricy, Adonias Filho, Murilo Araújo entre outros. Esse período marca a aproximação de Cecília com o modernismo.
Sua produção literária segue firme e ela publica mais quatro livros até 1933. Nesse período da sua vida vai atuar também como jornalista. Entre 1930 e 1931 publicou diversos artigos sobre as questões da educação no Brasil, assunto que lhe interessava diretamente. Em 1934 funda a primeira biblioteca infantil do Rio de Janeiro.
O ano de 1935 é marcado na vida de Cecília pelo trágico acontecimento do suicídio de seu marido, que sofria de depressão. Ela se torna viúva aos 34 anos, com três filhas para criar.
Entre 1935 e 1938 ela vai trabalhar na Universidade do Distrito Federal, que na época ficava no Rio de Janeiro, capital da República, lecionando literatura luso-brasileira e crítica literária. Mesmo diante das dificuldades, ela continua com a sua produção literária.
Cecília se casa novamente em 1940 com o engenheiro agrônomo Heitor Vinícius da Silveira Grilo, com quem viveria o resto de sua vida. Nesse mesmo ano eles viajam para os Estados Unidos onde ela daria um curso de Literatura e Cultura Brasileira, na Universidade do Texas, localizada na cidade de Austin. Na sequência ela participa de conferências no México, sobre literatura, educação e folclore.
Ao longo da década de 1940 ela publica diversos livros e faz várias viagens, passando por México, Chile, Uruguai e Argentina. O ano de 1951 marca a sua aposentadoria no magistério, como Diretora e, também, a realização de novas viagens, agora para França, Bélgica, Holanda e Açores.
Dois anos depois, em 1953, ela viaja à Índia, para participar de um congresso sobre a figura de Mahatma Gandhi, convidada pelo Primeiro-ministro indiano Jawaharial Nehru. Nessa ocasião ela foi agraciada com o título de ‘Doutor Honoris Causa’, por conta de suas traduções da obra do poeta, romancista e dramaturgo indiano Rabindranath Tagore.
Ao longo dessa década Cecília Meireles continua com uma forte produção literária, publicando quase duas dezenas de obras. Somente em 1955 ela lança três livros. Confira abaixo as principais obras da autora:

  • Espectros, 1919
  • Criança, meu amor, 1923
  • Nunca mais, 1923
  • Poema dos Poemas, 1923
  • Baladas para El-Rei, 1925
  • O Espírito Vitorioso, 1929
  • Saudação à menina de Portugal, 1930
  • Batuque, samba e Macumba, 1933
  • A Festa das Letras, 1937
  • Viagem, 1939
  • Olhinhos de Gato,1940
  • Vaga Música, 1942
  • Poetas Novos de Portugal, 1944
  • Mar Absoluto, 1945
  • Rute e Alberto, 1945
  • Rui — Pequena História de uma Grande Vida, 1948
  • Retrato Natural, 1949
  • Problemas de Literatura Infantil, 1950
  • Amor em Leonoreta, 1952
  • Doze Noturnos de Holanda e o Aeronauta, 1952
  • Romanceiro da Inconfidência, 1953
  • Poemas Escritos na Índia, 1953
  • Batuque, 1953
  • Pequeno Oratório de Santa Clara, 1955
  • Pistoia, Cemitério Militar Brasileiro, 1955
  • Panorama Folclórico de Açores, 1955
  • Canções, 1956
  • Giroflê, Giroflá, 1956
  • Romance de Santa Cecília, 1957
  • A Bíblia na Literatura Brasileira, 1957
  • A Rosa, 1957
  • Obra Poética,1958
  • Metal Rosicler, 1960
  • Poemas de Israel, 1963
  • Antologia Poética, 1963
  • Solombra, 1963
  • Ou Isto ou Aquilo, 1964
  • Escolha o Seu Sonho, 1964
  • Crônica Trovada da Cidade de San Sebastian do Rio de Janeiro, 1965
  • O Menino Atrasado, 1966
  • Poésie (versão francesa), 1967
  • Antologia Poética, 1968
  • Poemas Italianos, 1968
  • Poesias (Ou isto ou aquilo& inéditos), 1969
  • Flor de Poemas, 1972
  • Poesias Completas, 1973
  • Elegias, 1974
  • Flores e Canções, 1979
  • Poesia Completa, 1994
  • Obra em Prosa – 6 Volumes – Rio de Janeiro, 1998
  • Canção da Tarde no Campo, 2001
  • Poesia Completa, edição do centenário, 2001, 2 vols. (Org.: Antonio Carlos Secchin. Rio de Janeiro: Nova Fronteira)
  • Crônicas de educação, 2001, 5 vols. (Org.: Leodegário A. de Azevedo Filho. Rio de Janeiro: Nova Fronteira)
  • Episódio Humano, 2007

Essa produção fantástica seja como poeta, pedagoga ou tradutora fez de Cecília uma referência na literatura brasileira do século passado, levando a autora a receber inúmeros prêmios e homenagens, confira alguns abaixo:

  • Prêmio de Poesia da Academia Brasileira de Letras, pelo livro Viagem (1938)
  • Prêmio de Tradução de Obras Teatrais (1962)
  • Prêmio Jabuti de Tradução de Obra Literária pelo livro Poesia de Israel (1963).
  • Prêmio Jabuti de Poesia, pelo livro Solombra (1964).
  • Prémio Machado de Assis (1965)
  • Sócia honorária do Real Gabinete Português de Leitura
  • Sócia honorária do Instituto Vasco da Gama (Goa)
  • Doutora “honoris causa” pela Universidade de Delhi (Índia)
  • Oficial da Ordem do Mérito (Chile)

Curiosidades

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  • Cecília ficou órfã e mais tarde viúva muito cedo. Seu pai faleceu três meses antes de seu nascimento. Aos três anos a mãe faleceu. Aos 34 anos perdeu o marido, Fernando Correia Dias, que se suicidou;
  • Em 1934 funda a primeira Biblioteca Infantil do Brasil, no bairro do Botafogo, no Rio de Janeiro;
  • Em 1934 ela viajou para Portugal, para participar de uma série de conferências nas Universidades de Lisboa e Coimbra. Cecília queria aproveitar a oportunidade para conhecer o poeta português Fernando Pessoa, mas ele faltou ao encontro alegando que não poderia encontrá-la pois o seu horóscopo, naquele dia, não recomendava o encontro. Como forma de remediar a questão, Pessoa enviou a Cecília um exemplar do seu livro “Mensagem”;
  • Em 1934 Cecília fundou, com o primeiro marido, o Centro Cultural Infantil, uma biblioteca para crianças. O Centro seria fechado em 1937 durante o Estado Novo, após uma denúncia de que havia livros de conteúdo duvidoso no local. Detalhe, Cecília era crítica de Getúlio Vargas, a quem chamava de ‘O Ditador’;
  • Ela recebeu, em 1953, com o título de “Doutora Honoris Causa” oferecido pela Universidade de Déli, na Índia;
  • Em 1964 foi inaugurada a “Biblioteca Cecília Meireles”, na província de Valparaíso, no Chile;
  • Após a sua morte recebeu um prêmio da Academia Brasileira de Letras (ABL), como reconhecimento pela qualidade da sua obra. Apesar disso ela nunca ingressou na ABL, que, na sua época, era composta somente por homens. Rachel de Queiroz seria a primeira mulher a ingressar na Academia, em 1977,13 anos depois da morte de Cecília;
  • Em 1989 Cecília Meireles foi homenageada pelo Banco Central e a Casa da Moeda, que colocaram seu rosto na nota de 100 Cruzados Novos, que circulou de 1989 a 1992;
  • Cecília não gostava de ser chamada de poetisa, pois achava que isso diminuía seu trabalho. Ela se denominava uma poeta.

Últimos tempos

Cecília continua trabalhando, de forma incessante, sua produção literária. Mas, em 1962, ela recebeu o diagnóstico de câncer no estômago. Cecília Meireles viria a falecer no dia nove de novembro de 1964, no Rio de Janeiro, dois dias depois de completar 63 anos.
Ela deixou uma vasta e rica obra literária, respeitada e admirada não só no Brasil, mas em diversos países. Deixo aqui, para vocês, o poema de sua autoria “Ou isto ou aquilo”:

Ou isto ou aquilo

Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo nos dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo…
e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranquilo.

Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.

Uma poeta a frente do seu tempo

Cecília Meireles escreveu de tudo um pouco, fez poesia, prosa, contos, crônicas e textos para o teatro, e em todos os campos por onde se aventurou o fez com um imenso sucesso. Porém, foi na poesia que ela mais se destacou e onde ganhou fama. Criou, rimou e encantou. Passeou pelo simbolismo, flertou com o modernismo, fez uma poesia social e viveu uma fase intimista. E ocupou todos esses espaços fazendo um trabalho genial.
Foi uma mulher à frente do seu tempo. Numa época em que as mulheres eram muito pouco valorizadas pessoal e profissionalmente, situação muito pior do que acontece hoje em dia, Cecília ousou. Não contente em ter uma profissão e poder dela viver e ter o devido reconhecimento, ela teve várias, foi poeta, professora, jornalista, pintora e tradutora e em todas essas áreas ela foi muito bem-sucedida. Recebeu merecido reconhecimento no Brasil e no exterior. Foi uma poeta que foi além da poesia, possuía uma grande preocupação com a educação, pois entendia a sua importância na formação cultural do indivíduo.
Viveu uma vida complexa, com perdas irreparáveis quando ainda era muito jovem. Mas nada a impediu de produzir uma obra tão extensa quanto rica e eterna. Nos resta a alegria de podermos nos deliciar com sua poesia, que assim seja. Viva Cecília Meireles!

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Escritor Carlos Carvalho

Carlos Carvalho

Sou escritor, amante de literatura e apaixonado pelos mistérios criados por Agatha Christie. Escrevo contos, poesias e romances. Sendo o Romance Policial meu gênero literário preferido. Sou formado em Jornalismo e pós-graduado em Assessoria de Imprensa e Comunicação Empresarial.

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