Guimarães Rosa

Grandes clássicos da literatura, é disso que vamos falar nessa publicação, de mais um grande escritor, não só da nossa, mas da literatura universal. Hoje vou falar daquele que é considerado por muitos o maior escritor brasileiro do século XX e um dos maiores de todos os tempos. Um homem de uma capacidade intelectual fantástica. Aos seis anos começou a estudar francês. Ao longo do tempo, além desse idioma, aprendeu a falar inglês, alemão, espanhol, italiano e esperanto, isso sem considerar sua genialidade no domínio da língua portuguesa.
Dono de uma impressionante capacidade intelectual, foi escritor, diplomata, novelista, romancista, contista e médico. Como escritor, usou seu conhecimento para criar uma linguagem inovadora, com uma estrutura narrativa única, culminando com a criação de diversos vocábulos a partir de palavras que já haviam caído em desuso e outras ainda bem populares, invenções e intervenções semânticas e sintáticas.
Foi, sem dúvida, um dos autores mais notáveis da nossa história, em especial do século XX, que levou seu nome a ser cogitado para indicação ao Prêmio Nobel de Literatura. Infelizmente ele acabou falecendo e a indicação não foi concretizada.
Como diz o compositor:
“… as rosas não falam
Simplesmente as rosas exalam
O perfume que roubam de ti”
As rosas não falam, mas essa Rosa de que vamos falar hoje escrevia e muito bem, de forma genial. Vamos falar de Rosa, de Guimarães Rosa.

Prodígio nos estudos

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João Guimarães Rosa nasceu em Minas Gerais, na cidade de Cordisburgo no dia 27 de junho de 1908, era o filho mais velho dos seis que o casal Florduardo Pinto Rosa e Francisca Guimarães Rosa teve.
Foi um garoto precoce nos estudos. Com seis anos já estudava francês. Iniciou os estudos em sua cidade Natal, na escola Mestre Candinho. Depois, ainda criança, iria para Belo Horizonte, para a casa dos avós, para continuar os estudos do curso primário. Quando iniciou o curso secundário, foi para São João del Rei, para o Colégio Santo Antônio. Não se adaptou ao regime de internato e retornou a Belo Horizonte, onde conclui o curso. Em 1925, com apenas 16 anos ingresou na faculdade de Medicina de Universidade de Minas Gerais, de onde sairia formado em 1930. Nesse mesmo ano casaria com Lígia Cabral Pena, com que teria duas filhas, Vilma e Agnes. Ainda em 1930 vai para o município de Itaguara, à época um distrito da cidade de Itaúna, onde começa a clinicar. Nesse período passa a ter contato com o ambiente do sertão, que seria referência em sua obra.
Após dois anos, retornou a Belo Horizonte para servir como médico voluntário da Força Pública (Polícia Militar), no período da Revolução Constitucionalista de 1932. Foi servir na cidade mineira de Passa Quatro, onde conheceu o futuro presidente da República Juscelino Kubitschek, também formado em medicina, que atuava como médico-chefe do Hospital de Sangue.
Em 1934 é aprovado em um concurso para o Itamarati e torna-se diplomata, numa carreira que duraria aproximadamente 30 anos. Serve como cônsul em Hamburgo (1938-42), na Alemanha; depois como secretário de embaixada em Bogotá (1942-44), Colômbia. Em seguida vem para o Brasil e é nomeado chefe de gabinete do Ministro das Relações Exteriores, João Neves da Fontoura (1946); na sequência vai ser primeiro-secretário e conselheiro de embaixada em Paris (1948-51), França; secretário da Delegação do Brasil à Conferência da Paz, em Paris (1948); representante do Brasil na Sessão Extraordinária da Conferência da UNESCO, em Paris (1948); e delegado do Brasil à IV Sessão da Conferência Geral da UNESCO, em Paris (1949). Em 1951, retorna ao Brasil para ser novamente chefe de gabinete de João Neves da Fontoura que voltara a ser Ministro das Relações Exteriores. Em 1953 foi promovido a ministro de primeira classe. No ano de 1962 assumiu a chefia do Serviço de Demarcação de Fronteiras.
Quando serviu na embaixada em Hamburgo conheceu Aracy Moebius de Carvalho, com quem iria se casar e com quem viveria até a sua morte. Nessa época Guimarães Rosa já estava separado da primeira mulher.
Ainda em Hamburgo, tanto Guimarães como Aracy trabalhavam para o Itamaraty e eles, nesse período da Segunda Guerra Mundial, ajudaram muitos judeus na fuga para o Brasil, emitindo vistos além da quantidade estabelecida. Em 1942, com o rompimento, por parte do Brasil, da aliança com os alemães, Guimarães Rosa, assim como outros brasileiros que viviam na Alemanha, foi preso, sendo solto posteriormente.

Carreira literária

Sua estreia na literatura ocorreu em 1929, quando ainda era estudante de medicina, com a publicação, na revista ‘O Cruzeiro’, do conto “O Mistério de Highmore Hall”, que acabou não fazendo parte de nenhum de seus livros.
Em 1936 participou e venceu um concurso de poesias da Academia Brasileira de Letras com a coletânea de contos chamada “Magma”.
Publica seu primeiro livro, “Sagarana”, em 1946, um volume de contos que retrata a vida das fazendas mineiras e dos criadores de gado. Com um estilo de escrita novo para a época o livro torna-se um grande sucesso e conquista o Prêmio da Sociedade Felipe d’Oliveira, nesse mesmo ano. Guimarães Rosa começou a escrever a obra em 1937 e levou nove anos até concluí-la e publicá-la.
Com “Sagarana” ele coloca o regionalismo de volta no mapa da literatura brasileira, promovendo um casamento perfeito de cultura popular com o mundo erudito.
Guimarães Rosa morreu novo, aos 59 anos, não deixou uma obra extensa, mas muito rica culturalmente. Confira os principais livros do autor:

• Sagarana (1946)
• Corpo de Baile (1956)
• Grandes Sertões: Veredas (1956)
• Primeiras Estórias (1962)
• Tutameia – Terceiras Histórias (1967)
• Estas Estórias (1969) (Obra póstuma)
• Ave, Palavra (1970) (Obra póstuma)
• Magma (1997) (Obra póstuma)

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Se sua obra não foi extensa, a qualidade literária do seu trabalho lhe garantiu vários prêmios e o legado de um dos principais autores da literatura brasileira.

Prêmios
• 1937: 1º Prêmio de Poesia da Academia Brasileira de Letras, pelo livro “Magma”;
• 1946: Prêmio da Sociedade Felipe d’Oliveira, pelo livro “Sagarana”;
• 1956: Prêmio Machado de Assis, Prêmio Carmen Dolores Barbosa e Prêmio Paula Brito, todos pelo livro “Grande Sertão: Veredas”;
• 1961: Prêmio Machado de Assis, pelo conjunto da obra
• 1963: Prêmio do Pen Club brasileiro, pelo livro “Primeiras estórias”;
• 1966: Recebimento da Medalha da Inconfidência e da condecoração da Ordem de Rio Branco.

Grande Sertão: Veredas

“Sagarana” foi uma obra diferenciada, que teve muita repercussão e elevou o nome do autor no cenário literário brasileiro. Mas, o grande livro escrito por Guimarães Rosa foi, sem dúvida alguma, “Grande Sertão: Veredas”, seu maior sucesso editorial.
Em 1952, Guimarães Rosa fez uma viagem de mais de 200 quilômetros ao Mato Grosso, passando pelo sertão mineiro. Nessa excursão ele teve contato com os cenários, os personagens e as histórias que iria recriar em “Grande Sertão: Veredas”, sua obra prima. É o único romance escrito por Guimarães Rosa e um dos mais importantes textos da literatura brasileira. Publicado em 1956, “Grande Sertão: Veredas” já foi traduzido para vários idiomas. É a obra mais emblemática do escritor e uma das mais importantes da literatura brasileira.
É uma obra extensa, dividida em dois volumes. A história se passa em Goiás e nos sertões de Minas Gerais e Bahia. É contada por Riobaldo, um idoso ex-jagunço, protagonista do romance, o personagem-narrador que apresenta um relato sobre sua vida, desde seus medos, amores e traições. Ele descreve a história da vingança contra Hermógenes, jagunço traidor, que assassinou Joca Ramiro, o líder do bando de jagunços a que Riobaldo e o próprio Hermógenes pertenciam.
Riobaldo narra a guerra entre jagunços e, também, sua relação com o colega de cangaço Reinaldo, conhecido como Diadorim. Ele perturbava-se com essa relação, mas a alimentava com uma pureza que ia contra a rudeza do sertão, beirando o amor e o ciúme.
Ao final, Riobaldo descobre que Diadorim, na realidade, não era o que parecia ser, um desfecho surpreendente que mostra bem as divisões do ser humano em suas lutas internas do bem contra o mal, do certo contra o errado, isso dentro dos conceitos estabelecidos para a época, no sertão brasileiro.
Guimarães Rosa faz de “Grande Sertão: Veredas” uma narrativa épica, que descreve o homem simples do sertão em todas as suas dimensões. Ele desnuda a dura e cruel realidade do cangaço, as dúvidas existenciais e os mais profundos questionamentos do ser humano, a luta contra seus fantasmas interiores. Ele faz isso com uma narrativa bela, usando todos os recursos linguísticos que sua erudição permitia. Uma obra efetivamente singular.

Academia

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Guimarães Rosa candidatou-se duas vezes para a Academia Brasileira de Letras (ABL). Na primeira, em 1957, não venceu. Em 1963 voltou a se candidatar, sendo eleito por unanimidade, para ser o terceiro ocupante da cadeira número 2, que ficará vaga com a morte de João Neves da Fontoura, com quem Guimarães Rosa trabalhara por duas vezes como chefe de gabinete no Ministério das Relações Exteriores. Apesar de ter sido eleito em 1963, o autor adiou por diversas vezes a sua posse na ABL, o que só ocorreria em 16 de novembro de 1967.
Em seu discurso de posse ele diria, de forma profética, “…. a gente morre é para provar que viveu.” Três dias depois, em 19 de novembro de 1967, João Guimarães Rosa morreria, aos 59 anos, vítima de um ataque cardíaco.

Curiosidades

  • João foi o primogênito dos seis filhos de Florduardo Pinto Rosa e Francisca Guimarães Rosa, seu “Flor” e dona “Chiquitita”.
  • Criança precoce começou a estudar francês por volta dos seis anos de idade. Ainda jovem já falava diversos idiomas. Aos 16 entrou para a faculdade de medicina;
  • Diplomata atuando em Hamburgo (Alemanha), ele e a esposa protegeram diversos judeus dos nazistas. Como forma de reconhecimento, eles foram homenageados pelo Estado de Israel, que deu seus nomes a um bosque localizado nas encostas que dão acesso à cidade de Jerusalém;
  • Seu maior sucesso, “Grande Sertão: Veredas” foi transformado em minissérie pela Rede Globo durante os anos 1980, protagonizado por Tony Ramos (Riobaldo), Bruna Lombardi (Diadorin) e Tarcísio Meira (Hermógenes);
  • “Grande Sertão” também foi roteirizado para as histórias em quadrinhos por Eloar Guazzelli e desenhado por Rodrigo Rosa, em 2014. Eles ganharam o Troféu HQ Mix de melhor adaptação para os quadrinhos;
  • Diz a lenda que Guimarães Rosa manteve uma caderneta no bolso durante um bom tempo, no período em que exercia a medicina, e anotava frases, expressões e ditos populares, que mais tarde usaria como matéria-prima para seus livros.
  • “Grande Sertão”, considerada sua obra-prima e um dos melhores romances da nossa literatura, é um monólogo do início ao fim do livro;
  • Guimarães Rosa demorou quatro anos para assumir sua cadeira na ABL, após ser eleito e morreu três dias após a posse.

Sua importância

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Sem dúvida alguma João Guimarães Rosa é um dos escritores mais importantes da nossa literatura. Seja pela qualidade da sua obra, alcançada graças a sua inventividade e seu vasto conhecimento da nossa língua; seja pela fantástica habilidade para reinventar a língua portuguesa, criando vocábulos, fundindo arcaísmo, erudição e cultura popular, para sustentar a narrativa de uma gente simples, de pouca cultura. Isso tudo apoiado em um vasto conhecimento linguístico, como grande pesquisador e conhecedor de diversos idiomas que foi.
Infelizmente sua vida foi curta, para o tamanho do seu talento, isso, com certeza, nos privou de outras grandes obras que ele não teve tempo de escrever. Mas, o legado que ele deixou, apesar de não ser extenso, é uma brilhante construção simbólica de um Brasil que raramente está na ordem do dia. Um país rural, interiorano, onde os coronéis é que faziam as leis e a vida das pessoas pouco importavam e estavam sempre nas mãos de quem detinha o poder. Uma vida difícil, muitas vezes cruel, mas retratada de uma forma sutil e magistral por Guimarães Rosa. Sua passagem por aqui foi rápida, poderia ter sido bem mais longa. Mas seu legado cultural é eterno, pois a genialidade de um mestre da literatura, como ele, jamais será esquecida. Feliz a nação que tem com filho um escritor do tamanho de Guimarães Rosa.
Guimarães é uma Rosa que jamais irá morrer!

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Escritor Carlos Carvalho

Carlos Carvalho

Sou escritor, amante de literatura e apaixonado pelos mistérios criados por Agatha Christie. Escrevo contos, poesias e romances. Sendo o Romance Policial meu gênero literário preferido. Sou formado em Jornalismo e pós-graduado em Assessoria de Imprensa e Comunicação Empresarial.

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