Antes de começar a falar da dica literária que separei para vocês, gostaria de confessar uma coisa, eu sou fã de uma boa reconstituição histórica. Ela pode misturar ficção e realidade, não há problema. O importante é que descreva bem os fatos e a junção do real e do imaginário seja bem-feita. Acho muito interessante poder voltar no tempo e conhecer fatos e acontecimentos que se sucederam há muitos séculos.
Uma boa narrativa que consiga unir fatos que marcaram a história com uma pitada de inventividade é uma fórmula que considero muito interessante.
Já falei, anteriormente, sobre a saga, criada por Bernard Cornwell, das “Crônicas Saxônicas”, que segue exatamente essa linha para descrever a saga da formação da Inglaterra. Já deixei essa indicação de leitura aqui antes.
Então, agora, quero deixar a dica de mais uma saga, que marcou uma das épocas mais espetaculares da civilização, a do grande Império Romano. E para conhecer um pouco dessa história, recomendo a leitura da série “Os Senhores de Roma”, uma bela reconstituição histórica criada pelo escritor Allan Massie.
Nessa sensacional sequência de livros, Massie aborda um dos grandes momentos desse que foi um dos mais longevos, poderosos e importantes império de que temos conhecimento. O autor recria parte dessa trajetória, passeando pela vida de alguns dos maiores líderes romanos, como Júlio César, Marco Antônio, Augusto, Tibério, Calígula e Nero. Nela o autor descreve as brigas políticas, traições, assassinatos, conquistas, disputas pelo trono, enfim, tudo o que cercou a disputa pelo poder e o crescimento de Roma e o que levou a República a se transformar no Império mais poderoso da história.
Venha conhecer comigo um pouco mais dessa narrativa.
Roma
Roma, que ficou conhecida como um dos maiores Impérios da antiguidade, surgiu a partir da junção de sete pequenas aldeias de pastores sabinos e latinos, que viviam à beira do rio Tibres, que corta parte do território italiano e passa por Roma.
Na verdade, muitas lendas envolvem o aparecimento e a fundação da cidade. A maior de todas elas vem de narrativas do poeta Virgílio, escritor da “Eneida”. Segundo ele a ascendência romana vem do herói troiano Enéias, que teria fugido para a Itália por volta de 1400 a. C., após a queda de Tróia. Enéias teria deixado como descendentes os gêmeos Rômulo e Remo, que teriam sido jogados no rio Tibre por ordem de Amúlio, que usurpara o trono e queria garantir que a linhagem de Enéias estaria encerrada.
Os gêmeos teriam sobrevivido, sendo amamentados por uma loba. Depois seriam criados por um camponês até a fase adulta, quando retornariam a Roma para destronar Amúlio, recuperando o trono e fundando Roma, isso no ano de 753 a. C.. Após desentendimentos entre os irmãos, Rômulo teria assassinado Remo e se transformado em imperador de Roma, o primeiro deles.
Como sabemos, lendas são lendas, mas, a verdade é que Roma foi fundada, cresceu a partir da fusão das pequenas aldeias e se transformou num império que dominou o mundo por quase 500 anos. Essa história de crescimento e conquista é real, assim como seus personagens, que se tornaram alguns dos mais famosos imperadores e até hoje são lembrados, como Júlio César, Marco Antônio, Augusto, Tibério, Calígula e Nero.
Vamos acompanhar essa saga.
Júlio César
Caio Júlio César até hoje é considerado por muitos como um dos maiores comandantes militares da história da nossa civilização. Seus feitos ajudaram a transformar Roma no grande Império do mundo ocidental.
César era um militar e foi galgando postos no exército romano, até chegar ao topo, sempre construindo uma boa reputação, por meio das várias conquistas militares que alcançou. Ele liderou as investidas sobre a Península Ibéria, a Gália e a Bretanha. Em 60 a. C. fez parte do Primeiro Triunvirato do Império, juntamente com Crasso e Pompeu, tornando-se Cônsul. Era o trio que comandava a política e governava Roma.
As conquistas fizeram de César um líder respeito, com grande poderio militar e, por isso mesmo, temido pelos Senadores de Roma. Em 49 a. C. César entra em Roma com suas legiões de soldados, violando uma lei que impedia a marcha de generais na cidade. Essa sua atitude vai desencadear uma guerra civil, que será vencida por César que assume com plenos poderes, transformando-se no primeiro grande Imperador de Roma.
Além de concentrar o poder em Roma, César também vai promover uma aproximação do Império com o Egito, pois vai manter uma intensa relação amorosa com a rainha egípcia Cleópatra.
César assume o poder absoluto e inicia uma série de reformas sociais e políticas, continuando a centralizar o poder do Império. Essa concentração de poder incomoda parte classe política de Roma, que se opõem a sua forma de governar e passa a conspirar para tirá-lo do poder. Essa trama vai terminar com o assassinato de Júlio César, na escadaria do Senado, por volta de 44 a. C., por um grupo cujo líder era Decimus Junius Brutos Albinos, que era amigo de César, que o tratava como filho. Diz a lenda que, ao ver Decimus Brutus entre os seus assassinos, César teria dito a frase, “Até tu, meu filho?”.
César foi assassinado por um grupo de militares e políticos que temiam seu poder excessivo como Imperador, mas seu nome permaneceu vivo, como grande líder e tornando-se sinônimo de Imperador para muitos. Depois dele, os maiores imperadores de Roma ganhariam a alcunha de César.
Júlio César morreu, mas o poder que ele acumulou permaneceu no Império e seria disputado por vários grupos políticos e manteria viva a briga pelo controle de Roma e pelo direito a sentar no trono do César. Entre os senhores de Roma que sucederiam a César estava seu general, Marco Antônio.
Marco Antônio
O assassinato de Júlio César vai desencadear uma gigantesca luta pelo poder em Roma. Décimo Brutus e Cássio, líderes do grupo que assassinou o Imperador, reúnem um exército para tomar o poder em Roma. Em oposição a eles vão se unir Marco Antônio, o maior general de César, Caio Otávio, sobrinho neto de César, que foi por ele adotado e o general Emílio Lépido.
Marco Antônio, Otávio e Lépido saem vitoriosos desse confronto e vão compor o Segundo Triunvirato em Roma. A primeira ação do Triunvirato foi perseguir e combater os conspiradores que mataram César. Vencida essa etapa, os três se enredam em uma grande disputa pela supremacia do poder em Roma. A primeira tentativa de tomada do controle do Triunvirato seria feita pelo general Lépido, que falha e acaba perdendo poder e influência.
A partir desse momento a disputa seria direta entre Otávio e Marco Antônio. Os dois dividiriam o Império, com Otávio comandando a parte Ocidental, incluindo Roma, e Marco Antônio ficando com o controle da parte Oriental, que incluía os territórios conquistados na África e Ásia, incluindo aí o Egito, de Cleópatra, por quem Marco Antônio vai se apaixonar e com quem vai viver uma intensa história de amor que vai terminar com os dois mortos.
Cada vez mais próximo de Cleópatra e do Egito, Marco Antônio se afasta da política de Roma e permite a Otávio ampliar seu controle sobre o Senado romano. A aliança de Marco Antônio e Cleópatra não é bem-vista em Roma e isso vai custar caro ao general.
A tensão entre eles cresce e o confronto acaba sendo inevitável. Após diversas batalhas, Marco Antônio e Cleópatra sucumbem e Otávio ascende ao poder como único e grande imperador de Roma, assumindo o nome de Augusto, o “Imperador Deus”. Para não serem transformados em prisioneiros de Otávio, Marco Antônio e Cleópatra cometem o suicídio.
Augusto
Após derrotar Lépido e Marco Antônio, Otávio é o grande vitorioso e será nomeado, pelo Senado, o grande e principal general da República, sendo considerado o príncipe, recebendo o nome de Augusto. A República vira um Império. Esse período será consagrado com a expansão dos domínios de Roma, que por meio de muitas guerras e da força de seu exército, vai conquistar diferentes povos, subjugando esses ao controle de Roma, muitas vezes impondo a cultura romana a seus conquistados.
Na medida em que conquistava novos territórios e impunha a ordem de Roma, Augusto consegue estabelecer um período de relativa paz dentro do Império. Suas conquistas se direcionaram para todos os continentes, englobando territórios na África, Ásia e na própria Europa, avançando sobre aqueles que estavam fora do controle romano, como a Germânia.
Essa paz conquistada por Augusto possibilitou vários avanços na administração do Império, como a reforma do sistema tributário de Roma, a construção de uma rede de estradas ligando partes do Império, o estabelecimento de um sistema de correio oficial, melhorando a comunicação entre as cidades, a criação de um exército permanente e da guarda pretoriana, a guarda pessoal do Imperador.
Augusto expandiu e consolidou o Império Romano, criando a estrutura de governo que dominaria o mundo por mais cinco séculos. Ele morreria aos 75 anos, deixando como seu sucessor seu filho adotivo Tibério.
Tibério
Tibério sempre esteve próximo ao poder de Roma. Quando ele estava com quatro anos sua mãe Lívia se casou com Augusto. Ele então foi educado na carreira militar, galgando posto e obtendo sucesso em campanhas na Germânia, Armênia e na Gália, ganhando prestígio dentro e fora do exército.
No ano 13 a. C. Tibério foi nomeado Cônsul e, em 12 a. C. casa-se com Júlia, filha de Augusto. Anos mais tarde seria nomeado tribuno e se exilaria na ilha de Rodes, na Grécia.
Antes de morrer, Augusto reconhece Tibério como seu único sucessor. O ano 14 traz a morte de Augusto e Tibério é aprovado pelo Senado, tornando-se Imperador, o sucessor de Augusto.
Ele governa com severas medidas restritivas para regularizar a economia, reduzindo gastos. Mantém as fronteiras conquistadas por Augusto. Depois, já mais próximo do final de sua vida, ele vai adotar Calígula, membro da dinastia de César como filho e herdeiro político.
Tibério vai falecer no ano de 37. Um outro fato vai marcar a vida de Tibério, pois foi durante o seu reinado que Jesus Cristo foi crucificado.
Calígula
Nascido Caio Júlio César Germânico, Calígula era filho de Germânico, general do exército romano, e Agripina e se tornaria, em 37, o terceiro Imperador de Roma. Desde criança Calígula costumava acompanhar seu pai nas campanhas do Exército, se transformando em mascote da tropa.
Calígula reinaria por quatro anos e ficaria conhecido por ser um governante cruel, pervertido e extravagante. Segundo muitos historiadores ele chegou ao ponto de manter relações sexuais com suas irmãs.
No ano de 41 Calígula seria assassinado pela guarda pretoriana, numa conspiração que envolveu vários senadores. Após o assassinato, quem assume o trono é o tio de Calígula, Cláudio, que determina a imediata execução dos matadores de seu sobrinho.
Nero
A sequência dos livros de Massie fala do reinado de Nero e de seus herdeiros. Nero foi um dos mais polêmicos imperadores de Roma. Nos primeiros anos foi um bom administrador. Na política externa não demonstrou muito interesse na expansão do Império.
Por outro lado, na política interna foi autoritário, defendendo seu trono de todas as formas. Foi acusado de várias mortes de pessoas próximas, como sua mãe Agripina, seu irmão, duas de suas esposas e vários opositores políticos que se colocaram em seu caminho.
Essas atitudes ajudaram a criar sua fama de imperador desequilibrado e violento. Ele também seria responsabilizado pelo incêndio que destruiu parte da cidade, ficando conhecido como o Imperador que incendiou Roma.
Se sua vida foi polêmica, sua morte não poderia ser diferente, pois Nero cometeu o suicídio em 68, encerrando ali a dinastia inaugurada por César.
O autor
A história desses Senhores de Roma é bem maior e mais complexa do que o que foi exposto nesse texto. A ideia aqui é simplesmente apresentar a obra e despertar a atenção do leitor para essa saga maravilhosa, escrita com maestria por Allan Massie.
O autor nasceu em Singapura, em 19 de outubro de 1938. Passou sua infância e parte da juventude na Escócia. Estudou história, na Inglaterra, no Trinity College, da Universidade de Cambridge. Ele é escritor, jornalista e historiador, já tendo escrito mais de 25 obras.
Um Império, uma história
A história do Império romano é rica em batalhas, conquistas, grandes vitórias e outras tantas derrotas. Foi um momento que marcou a expansão de um império que marcaria a história, não só pelo tanto de território que foi conquistado, mas também pela grandiosidade do legado político, social e arquitetônico que foi deixado para as futuras gerações.
Aqui apresentei apenas uma ponta de tudo o que foi essa saga, que durou aproximadamente cinco séculos. É para despertar sua curiosidade, caro leitor, pois essa é uma história que merece ser contada, como Allan Massie fez de forma brilhante com essa sequência de livros, e que merece muito ser lida, pois apresenta ao mundo os limites do ser humano em suas ambições na disputa por poder e riqueza.
Conhecer a história de “Os Senhores de Roma” é entender a formação da sociedade ocidental, por isso não deixe de ler essa série, vale muito a pena.