19 – A verdade
Luís Antônio fez contato com a recepção da firma e liberando o acesso direto de Ricardo e Nando. Após alguns minutos os policiais entraram na sala acompanhados pelo sócio de Luís.
– Seu desgraçado, o que você fez, destruiu todo o trabalho, a empresa vai à falência. – gritou Luís partindo para cima do homem que estava a sua frente e sendo contido por Luciano.
– Calma, senhor Luís. – pediu o delegado – Não adianta querer partir para a briga agora, isso não vai resolver nada – É hora de colocar a cabeça no lugar e fazer uma análise nas contas da empresa, para o senhor saber qual é a real situação financeira da firma.
– Esse desgraçado arruinou minha vida, o estrago já está feito, agora é tarde. Como você teve essa ideia seu canalha.
O homem à frente de Luís Antônio manteve-se em silêncio, de cabeça baixa. Quem voltou a falar foi Luciano.
– Se eu não estiver enganado, na verdade seu sócio não bolou essa trama, ele apenas a executou, assim como os demais.
– E quem planejou tudo isso? Fala seu miserável. – esbravejou Luís.
– Na verdade toda a condução dessa operação ficou sobre a responsabilidade da mesma pessoa, certo coronel Guilherme? – indagou Luciano.
– Tudo bem, delegado, o senhor tem razão, chegamos ao fim da linha, não há mais nada a fazer. – falou o militar.
– E quem é o cabeça de tudo isso? – insistiu Luís Antônio.
– A pessoa que planejou, organizou, convenceu os homens a participarem de toda a operação. Uma pessoa ambiciosa, que queria ganhar muito dinheiro e sabia ser persuasiva. – Luciano abriu a porta da sala para que Décio entrasse com a peça que faltava nesse quebra cabeça.
– Você? – berrou Luís Antônio que olhava atônito para a figura que era conduzida por Décio – Você não, Suzana. Como você pode, eu confiei em você, meu amor. Como você pode me trair?
A mulher esboçou um sorriso com a confusão gerada por sua entrada na sala. Guilherme foi levado por Ricardo e Nando. Luciano então se dirigiu a Luís Antônio.
– Eu posso conversar alguns minutos a sós com a dona Suzana, ainda tem alguns pontos que precisam ser esclarecidos.
– Tudo bem. – Luís Antônio estava definitivamente abatido, nem esboçou reação. A constatação de que Suzana era parte de tudo aquilo foi devastadora para ele. O homem deixou a sala, enquanto Luciano e Décio permaneciam com a mulher. O delegado fez um sinal para que Suzana se sentasse.
– Pois bem, a senhora era a cabeça pensante de toda essa trama? – inquiriu o policial.
– Delegado, é muito ruim trabalhara no meio de homens medíocres e sem imaginação, uns verdadeiros patetas. Nós tínhamos uma mina de ouro a nossa frente e eles não estavam nem aí. – colocou ela.
– E como a senhora escolheu seus parceiros nessa aventura?
– Não foi difícil. Eu já trabalhava há muitos anos aqui, conhecia bem o Luís Antônio e sabia que ele não iria topar esse tipo de ação. É ladrãozinho barato, sonegador de impostos, faz alguns acertos com os clientes para lavar um dinheiro, mas sempre coisa pequena, não sabe pensar alto.
– E como o coronel entrou nessa jogada? – perguntou Luciano.
– Há uns seis anos a empresa passou por algumas dificuldades financeiras e o Luís trouxe o Guilherme para cá. Ele entrou com algum dinheiro e passou a cuidar dos clientes, aproveitando-se do fato de ser um coronel reformado do exército, isso impressionava potenciais clientes. A coisa começou a funcionar bem, o Guilherme sabia vender a empresa, as pessoas confiavam nele, por ser militar. Ele nem precisava vir até aqui, tratava com os clientes e depois nos repassava as informações. Ele preferia ficar no anonimato, a mulher nem sabia dessa transação dele.
– Onde você entrou nessa história?
– Há uns quatro anos encontrei o Guilherme aqui embaixo e fomos almoçar. Ele gostava de falar, tinha um jeito arrogante de se colocar, mas percebi que ele passava por problemas com a esposa. Era autoritário da porta de casa para fora, dentro quem mandava era a mulher. Ele era muito frustrado com isso, o militar acostumado a mandar nos subalternos tinha que obedecer à mulher. Percebi isso e resolvi tirar partido desse fato.
– O que ocorreu? – quis saber Décio.
– Mantive contato permanente com ele, começamos a nos encontrar com frequência para almoçar, tomar um café. Percebi que a insatisfação dele estava aumentando, assim como vi que ele estava alimentando uma mágoa com o Luís Antônio por causa do Gustavo.
– Como assim? – perguntou Luciano.
– Ele descobriu que o irmão era gay e queria que ele fosse demitido, mas o Luís não queria, ele gostava do Gustavo, que era funcionário antigo e era muito competente. Entendi que aquele era o momento para investir sobre o Guilherme. Deixei o pateta me levar para a cama e o convenci a encabeçar o plano. Não foi difícil, nós transamos e o bobo achou que era o maioral. Trabalhei minha vida inteira na área de Recursos Humanos e já fiz muitos processos seletivos. Com o passar dos anos não foi difícil identificar as pessoas certas, nas posições certas para montarmos o esquema.
– Então foi você quem recrutou todas as pessoas?
– Praticamente todos, escolhi o Marcílio e o Gilmar, o gerente de operações e ele me trouxe os dois profissionais prontos para participarem do golpe e eu os contratei.
– O plano perfeito?
– Quase. Não contava que o Marcílio fosse ficar ambicioso demais e se juntar ao Guilherme para tirar dinheiro da empresa, isso eu não planejei. Os dois babacas misturaram os assuntos.
– Você não sabia disso? – perguntou Luciano.
– Não, isso não fazia parte do plano. Só fiquei sabendo quando o Gustavo descobriu o desvio. Então resolvemos chantageá-lo para que ele silenciasse. Nunca poderíamos imaginar que ele fosse cometer o suicídio.
– E por que ajudou os dois se você não sabia de nada?
– Não podia arriscar. Se o Gustavo denunciasse o desvio, muito provavelmente haveria uma devassa na empresa e todo o meu plano estaria em risco. – respondeu ela.
– E o Guilherme nem se preocupou em que o próprio irmão fosse chantageado? – perguntou Décio.
– Ele queria era se livrar do irmão. Ficou louco da vida quando soube que o Gustavo havia descoberto o desvio. No fundo nem se importou com a morte do irmão.
– Bem. – disse Luciano – Parece que agora nenhum de vocês vai chantagear mais ninguém, vão passar uns bons anos atrás das grades.
– Faz parte do jogo, delegado. Foi bom enquanto durou. O meu erro foi recrutar um bando de homens, são todos uns merdas. Se tivesse recrutado mulheres hoje eu estaria bem, as mulheres sabem trabalhar.
– Pode ficar tranquila, pois na cadeia você vai estar rodeada de mulheres e vai poder retrucar várias. – zombou Décio.
– Fiquem tranquilos, quem sabe eu não volto um dia. Desta vez vocês venceram. Parabéns, delegado. Quem sabe da próxima eu leve a melhor.
– Vai ter que ficar para a próxima mesmo. – falou Luciano – podem levar ela.
Depois que todos os envolvidos haviam sido detidos, os quatro policiais se reuniram.
– A mulher é dura na queda, delegado. – afirmou Nando.
– Sem dúvida, uma mulher muito inteligente, que manipulou os homens com muita facilidade. Não fosse pelo suicídio do Gustavo, eles continuariam com o esquema por muito tempo. – disse Luciano.
– E por que ninguém denunciava a extorsão? – indagou Décio.
– Eles sabiam escolher as vítimas. As pessoas tinham muito a perder e preferiam pagar pelo silêncio da quadrilha. O Gustavo não aguentou e preferiu tirar a própria vida. Acabou denunciado os bandidos do mesmo jeito. – disse o delego.
– É verdade. Agora, esse coronel é um grande canalha, todo metido a moralista e metido em toda essa sujeira. – comentou Nando.
– O mundo está cheio de falsos moralistas, ele só é mais um. O que você poderia esperar de uma pessoa incapaz de respeitar e amar um irmão por conta de suas escolhas sexuais? – indagou Luciano.
– Não dá para esperar nada mesmo. – sentenciou Ricardo.
– Exatamente isso. – concordou Luciano – Vamos pessoal, caso encerrado.
Os policiais deixaram a empresa de vigilância e voltaram para a delegacia.