A arte é uma forma fantástica de expressão, seja em qual formato for, por meio de um romance, um poema, um filme, uma peça teatral, uma música, ela chega e tem um poder mágico de nos encantar e embalar.
Ao longo dos anos tivemos o privilégio de conhecer homens e mulheres fantásticos, que emprestaram à arte o seu talento e nos forneceram verdadeiras pérolas culturais. O Brasil, nesse sentido, foi abençoado com uma infinidade de escritores, poetas, dramaturgos, cineastas, músicos e outros grandes artistas que enriqueceram nossa arte e deram vida à nossa vida cultural.
A poesia foi um desses veios que nos ofereceu o mais puro ouro em termos culturais. Muitos são os poetas e poetisas brasileiros que encantaram o mundo com seus textos fenomenais, como Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Cecília Meireles, Manuel Bandeira, só para citar alguns. Esse poeta de quem vamos falar, em especial, foi um dos maiores. Além de ter sido um grande poeta, também foi brilhante, compositor, dramaturgo, cantor, jornalista. Como se não bastasse, foi diplomata de carreira.
Foi excepcional em tudo o que fez. Com tantos predicados, só poderia ser considerado um gênio da nossa cultura. Então, com muito carinho, vamos falar do poeta que foi chama, mas, mesmo assim, imortal, é que se tornou infinito enquanto dura, Vinícius de Moraes.
Juventude
Marcus Vinícius da Cruz de Melo Moraes, ficou conhecido como Vinícius de Moraes, nasceu no Rio de Janeiro, no bairro da Gávea, no dia 19 de outubro de 1913. Era o segundo dos quatro filhos do casal Clodoaldo Pereira da Silva Moraes, que trabalhava na Prefeitura do Rio e era poeta e violonista nas horas vagas e de Lydia Cruz de Moraes, também amante da música e que era pianista amadora.
Aos três anos Vinícius muda com a família para o bairro de Botafogo, quando inicia seus estudos na Escola Primária Afrânio Peixoto. Desde muito novo ele demonstrava aptidão e interesse em escrever poesias. Em 1922 sua mãe, Lydia adoece e a família vai morar na Ilha do Governador. Vinícius e a irmã mais velha, Lygia, ficam na casa do avô, em Botafogo, para terminar os estudos do curso primário.
Em 1924, com 11 anos, foi estudar no Colégio Santo Inácio, tradicional escola católica do Rio de Janeiro, fundada pelos padres jesuítas. Lá Vinícius começou a cantar no coral da escola e passou a montar peças de teatro. Também no Santo Inácio conheceu os irmãos Haroldo e Paulo Tapajós, com quem começa a compor suas primeiras músicas e fazer apresentações em festas de amigos. Com Haroldo compôs suas primeiras canções, como “Loura ou Morena”.
Termina os estudos no colégio em 1929. No ano seguinte ingressa na Faculdade de Direito do Catete, atual Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). No ano de 1933 ele alcançava a graduação em Ciências Jurídicas e Sociais.
Início de carreira
Em 1932 tem seu primeiro poema publicado, “A Transfiguração da Montanha”, na revista ‘A Ordem’. Em 1933 publica seu primeiro livro, “O Caminha para a Distância”. O segundo livro, “Forma e Exegese”, é publicado em 1935, conquistando o prêmio Felipe de Oliveira e recebendo elogios do poeta Manuel Bandeira.
Nessa época Vinícius também continuava compondo. Ainda em 1933 compõe, com Joaquim Medina, “Dor de uma Saudade”, gravada pelo próprio Medina e por João Petra de Barros. No mesmo ano os irmãos Tapajós gravam “O Beijo que você não quis dar”, parceria com Haroldo, e “Canção da Noite”, parceria com Paulo. Em 1934 os irmãos gravariam “Canção para Alguém”, composta com Haroldo.
Nessa época Vinícius de Moraes firmaria amizade com alguns dos maiores poetas daquele tempo como Manuel Bandeira, Mário e Oswald de Andrade.
Em 1938, por conta de uma bolsa, foi estudar literatura inglesa na Universidade de Oxford, na Inglaterra, mas teve que retornar ao Brasil no ano seguinte por conta do início da Segunda Grande Guerra, em 1939.
Em 1941 passa a trabalhar como crítico de cinema no jornal ‘A Manhã’.
A carreira literária de Vinícius foi brilhante, tendo publicado os seguintes livros de poesia:
– O Caminho Para a Distância (1933)
– Forma e Exegese (1935)
– Ariana, a Mulher (1936)
– Novos Poemas (1938)
– Cinco Elegias (1943)
– Poemas, Sonetos e Baladas (1946)
– Pátria Minha (1949)
– Antologia Poética (1955)
– Livro de Sonetos (1956)
– O Mergulhador (1965)
– A Arca de Noé (1970)
A obra poética de Vinícius é rica e marcou época. Entre os grandes poemas que ele escreveu destacamos o “Soneto da Fidelidade”, publicado em 1946, e considerado um dos grandes poemas da nossa literatura:
De tudo, ao meu amor serei atento antes
E com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento
E assim quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa lhe dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure
Teatro
Se a produção poética de Vinícius foi brilhante, na dramaturgia ele não ficou atrás e escreveu diversas peças que fizeram grande sucesso, como:
– Orfeu da Conceição (1956)
– As feras (1961)
– Procura-se uma rosa (1961)
– Cordélia e o peregrino (1965)
Carreira Diplomática
Sem dúvida alguma a arte e a cultura eram a vida de Vinícius de Moraes, escrever era sua grande vocação. Mas ele também construiu uma bela carreira diplomática, iniciada em 1943 quando é aprovado no concurso para Diplomata, no Instituto Rio Branco, do Ministério das Relações Exteriores.
Três anos depois, em 1946 ele assume o posto de vice-cônsul em Los Angeles, nos Estados Unidos. Na década de 1950 ele serve em países como França, Itália e Uruguai. Retorna ao Brasil em 1964 e, em 1968, é aposentado de forma compulsória por conta do AI-5, o conhecido Ato Institucional Número Cinco, promulgado pelo governo do general Costa e Silva, o mais duro dos atos institucionais baixadas pelo regime militar.
O motivo alegado para o afastamento de Vinícius de suas funções foi o seu comportamento, considerado boêmio pelos militares o que, segundo eles, o impedia de cumprir suas funções diplomáticas. Segundo vários de seus amigos esse afastamento deixou uma mágoa profunda no poeta.
Somente em 1998 ele seria anistiado pela justiça. Em 2010, por conta da Lei nº 12.265, recebeu uma promoção póstuma ao cargo de Ministro de Primeira Classe.
Música
A carreira artística de Vinícius foi grandiosa, seus poemas, brilhantes marcaram época e encantaram os leitores. Mas, sem dúvida, a música é um capítulo especial em sua vida. Suas grandes composições e as fantásticas parcerias que ele firmou ao longo da vida fizeram de Vinícius de Moraes um ícone na nossa música. Provavelmente nenhum outro compositor brasileiro fez tantas e tão boas parcerias musicais como ele.
Ao longo do tempo o “Poetinha” firmou parcerias musicais com grandes nomes da nossa música, como:
– Adoniran Barbosa;
– Alaíde Costa;
– Ary Barroso;
– Baden Powell;
– Carlos Lyra;
– Chico Buarque;
– Edu Lobo;
– Fagner;
– Francis Hime;
– Haroldo Tapajós;
– Jards Macalé;
– João Bosco;
– Paulo Tapajós;
– Pixinguinha;
– Tom Jobim;
– Toquinho.
O final da década de 1950 seria marcante para Vinícius de Moraes e um grupo de músicos, mas principalmente para a música brasileira com o surgimento da Bossa Nova. Em 1958 seria lançado o disco “Canção do Amor Demais”, da cantora Elizeth Cardoso, um marco do início do movimento dessa nova bossa musical. Várias músicas que faziam parte do disco eram de autoria de Vinícius de Moraes e Tom Jobim. Esse álbum contaria também com a participação de um violonista que iniciava sua carreira e marcaria aquele momento com uma forma inovadora de tocar violão, seu nome: João Gilberto.
Além de uma grande parceria com Tom, Vinícius fez grandes trabalhos com Baden Powell, Edu Lobo, Carlos Lyra, Chico Buarque e Toquinho, considerada por muitos sua melhor parceria.
Vida Pessoal
Se a vida profissional e artística de Vinícius foi interessante, sua vida pessoal não foi muito diferente, com certeza foi bastante agitada. Vinícius era um homem de grandes paixões. Considerado um romântico e grande sedutor, Vinícius de Moraes foi casado nove vezes.
Sua primeira esposa foi Beatriz Azevedo de Mello, com quem teve dois filhos, Suzana e Pedro. Depois ele se casaria com Regina Pederneira; Lila Bôscoli; Maria Lúcia Proença, com quem teria mais dois filhos, Georgiana e Luciana; Nellita de Abreu; Cristina Gurjão, com teve sua última filha, Maria; Gesse Gessy, Marta Rodrigues; e Gilda Matoso, que viveu com ele até a sua morte.
Vinícius faleceu em casa, no bairro da Gávea, no Rio de Janeiro, no dia nove de julho de 1980, vítima de um edema pulmonar.
Frases
Autor, compositor, cantor, Vinícius foi um grande artista, mas também se destacou como um grande criador de frases, que se tornariam famosas, como:
– “Eu talvez não tenha muitos amigos, mas os que eu tenho são os melhores que alguém poderia ter.”
– “Eu poderia, embora não sem dor, perder todos os meus amores, mas morreria se perdesse todos os meus amigos.”
– “Se o cachorro é o melhor amigo do homem, então whisky é o cachorro líquido.”
– “Se o amor é fantasia, eu me encontro ultimamente em pleno carnaval.”
– “A vida é a arte do encontro, embora haja tantos desencontros nesta vida.”
– “A vida é a espera da morte. Faça da vida um bom passaporte.”
Curiosidades
– Seu primeiro livro “O Caminho para a Distância” foi publicado quando ele estava com apenas 20 anos;
– Em 1968, durante o regime militar, foi afastado das suas funções diplomáticas e aposentado compulsoriamente. Alguns dos motivos alegados para tal era que Vinicius era boêmio, fumante e gostava de beber whisky;
– Vinicius estudou cinema em Los Angeles, com um professor muito especial, Orson Welles, que foi o diretor do clássico filme Cidadão Kane;
– Sua música mais tocada é Garota de Ipanema, que compôs em parceria com Tom Jobim. É também sua música mais famosa, já tendo sido cantada por ninguém menos que Madonna e Amy Winehouse;
– Já foram feitas mais de 170 versões de Garota de Ipanema em todo o mundo;
– Somente depois que a música foi lançada que Vinícius revelou quem era a sua fonte de inspiração, Helô Pinheiro;
– O Poetinha foi um campeão na arte da união conjugal, casou-se nada menos do que nove vezes;
– Sua peça “Orfeu da Conceição” foi adaptada duas vezes para o cinema e, com o título de “Orfeu Negro”, a primeira adaptação ganhou a Palma de Ouro do Festival de Cannes, em 1959 e o Oscar, em 1960. A direção foi do cineasta francês Marcel Camus;
– Ele tinha o hábito de ler, escrever e compor sentado numa banheira.
– Certa vez passou duas semanas trancado em um apartamento, com Baden Powell, trabalhando em diversas músicas. O resultado: 20 novas composições criadas e três caixas de whisky esvaziadas.
Nosso Poetinha
O que falar da obra de Vinícius de Moraes? O que posso dizer é que ele foi simplesmente genial em tudo o que fez, poesia, música, teatro. É difícil encontrar outro artista brasileiro que demonstrou tanto talento nas mais diversas áreas da cultura.
Geralmente fala-se de Vinícius de Moraes como poeta, ganhou até o apelido de “Poetinha”, com toda a justiça. Mas como podemos esquecer o Vinícius compositor, que produziu verdadeiras obras de arte com os mais diversos músicos. Foi um dos criadores de um novo estilo musical brasileiro, a Bossa Nova. E o Vinícius dramaturgo, que escreveu peças que se tornaram referência no teatro brasileiro e que, adaptadas para o cinema conquistaram o mundo.
Vinícius de Moraes era o verdadeiro artista multitalentos. Fez muito de tudo e sempre o fez de forma brilhante.
Com todo esse talento, ele deixou um trabalho grandioso, que merece ser reverenciado. Que possamos, com muito orgulho, dizer que amamos seu legado, posto que é chama, mas que se tornou imortal e com certeza será infinito enquanto dure, pois irá durar para sempre.
Se você conhece a obra de Vinícius de Moraes, deixe aqui sua opinião. Se não conhece, corre lá pois vale muito a pena.
Viva o Poetinha!