14 – A revelação
– Isso é uma palhaçada, vou processar vocês. – gritou ela.
– Calma, dona Solange. – falou Ricardo, esperando pelo silêncio da mulher. – Como eu ia dizendo vai precisar dos serviços do doutor Paulo, não para a senhora, mas para os seus filhos.
– O que? – o grito de Solange foi maior ainda.
– Você pode fazer o favor de explicar tudo isso, inspetor. – pediu Olavo, que a essa altura também já se encontrava de pé.
– Foram seus sobrinhos que mataram dona Marieta, seu Olavo. – colocou Ricardo.
– Policial filho da puta. – berrou Solange.
Olavo permaneceu parado, de braços cruzados, encarando Ricardo, esperando pelas explicações.
– Espero que você tenha uma boa explicação para toda essa cena. – ponderou Olavo.
– Nós temos explicação para toda a situação. Primeiro, cuidado com a língua, dona Solange. – falou Ricardo e se voltou para Olavo para continuar a explicação – Seus sobrinhos já tiveram vários registros em delegacias por porte de drogas. No caso do Marcelo até mesmo por pequenos furtos. Ambos estavam com dívidas com seus fornecedores, que precisavam ser pagas. Eles procuraram a avó, mas ela se negou a ajudar. A Rosa confirmou isso. Então bolaram um plano bem simples para matá-la e pegar parte do dinheiro. Mônica esteve lá no sábado, dopou a avó, a colocou para dormir. A quantidade de sonífero encontrada no sangue foi alta, provavelmente para que ela passasse o domingo sonolenta. No domingo à tarde, dia que não tem porteiro e que o sistema de câmeras estava inoperante, Marcelo passa por lá antes de ir encontrar os amigos. Ele chega no apartamento e tenta uma última vez conseguir dinheiro com ela, mas ouve uma nova recusa. A discussão é no quarto e Marcelo a ameaça, dona Marieta diz que vai pegar o telefone e ligar para Olavo e contar tudo. Nervoso ele coloca o pé na frente e provoca o tombo da avó, ela cai com o tornozelo fraturado. Ela pede que Marcelo ligue para o socorro. Ele diz que vai pedir socorro, mas pega um objeto de madeira e atinge dona Marieta, a própria bengala dela. Depois de se certificar que ela estava morta, rapidamente apaga algumas impressões digitais do quarto, manda uma mensagem para a irmã explicando tudo o que aconteceu e sai para encontrar os amigos. Temos as imagens da câmera do prédio vizinho, que registra o horário da sua entrada e, também, da sua saída. Temos as trocas de mensagens, pelo WhatsApp, em que vocês relatam cada passo dado tanto no sábado, como no domingo.
Ricardo deu uma pausa, na verdade, foi obrigado pois Solange desabava no chão, desmaiada. Nando e Olavo correram para socorrê-la, enquanto Mônica se afastava do policial aos berros.
– Vocês estão loucos, seus monstros.
Aproveitando-se do princípio de confusão, Marcelo correu em direção à porta, buscando uma rota fuga, mas a entrada estava bloqueada pelo delegado e mais três policiais, que aguardavam do lado de fora, já com mandados de prisão em mãos. Os dois jovens foram algemados e levados para a viatura.
– Não estou conseguindo acreditar nisso. – falou Olavo se dirigindo a Ricardo – Tudo bem que todos nós temos os nossos defeitos, nunca gostamos de trabalhar mesmo, gastamos o dinheiro dos velhos com a maior naturalidade, não fomos bons filhos e netos, mas daí a cometer um assassinato dessa forma, com tanta crueldade, contra a própria avó. É muito para minha cabeça.
– Eu entendo senhor Olavo. Mas vocês são pessoas diferentes. O senhor não pode desconsiderar o fato deles estarem envolvidos com traficantes e isso muitas vezes pode significar uma sentença de morte. Eles devem ter entrado em desespero com as ameaças e tomaram essa atitude extrema. Não estou justificando, só tentando entender o que os motivou.
– Você tem razão, inspetor. Cada pessoa reage de uma maneira. E o que vai acontecer com eles agora?
– As provas são muito claras, o caso não é complicado. Sem contar o fato de que foram encontradas algumas impressões digitais deles no apartamento, mais uma prova de que eles estiveram por lá no final de semana. Eles vão ficar presos e, provavelmente, irão a julgamento. Acredito que peguem uns bons anos de prisão.
– Não sei o que dizer. – disse Olavo – Acho que o melhor a fazer é avisar o doutor Paulo.
– É uma boa providência, eles vão precisar muito de um advogado. – falou Nando.
– Bem, encerramos por aqui, senhor Olavo. Lamento muito por tudo o que aconteceu. – falou Ricardo se despedindo.
– Eu também lamento, inspetor. – falou ele.
Os dois policiais desceram.
– Vamos voltar para a delegacia e preparar toda a papelada para entregar ao delegado. – falou Ricardo.
– Vamos nessa. – concordou Nando.
Quando estavam no portão ouviram alguém chamando por Ricardo, eles se viraram e viram Marcelle, que vinha correndo.
– Inspetor. – chamou ela.
Nando percebeu que havia algo no ar e se afastou em direção ao carro.
– Diga. – falou Ricardo.
– Tudo isso foi muito louco, está difícil de acreditar. – disse ela, ainda ofegante da corrida.
– Infelizmente essas coisas acontecem. O ser humano é capaz das melhores atitudes, mas também das piores.
– Por que você foi se encontrar com a Mônica? Você não explicou essa parte em sua narrativa.
– Bem. – Ele parecia um pouco embaraçado para falar.
– Tudo bem, se é segredo, se foi um encontro pessoal, não tem problema.
– Na verdade, foi pessoal, mas não comigo. Acho que eles estavam com medo de serem descobertos e tentaram uma jogada. Ela esteve lá uma semana antes do crime e ficou sabendo que você também tinha estado com a sua avó. Então ela me chamou para dizer que dona Marieta tinha confidenciado que você a havia ameaçado por causa de dinheiro, que você estava transtornada. Mencionou a ligação que fez para você na segunda-feira. Tudo o que ela falou pra mim era passível de ser verificado. As câmeras de segurança do prédio, a ligação telefônica. Em resumo, ela queria desviar a nossa atenção jogando suspeita sobre você.
– Filha da puta. Minha própria prima mata a avó e tenta me culpar.
– Depois teve a farsa do atentado.
– Foram eles também?
– O carro utilizado foi roubado aqui no Humaitá, um pouco antes da hora em que fomos atacados foi encontrado e o pessoal da perícia está trabalhando na identificação de digitais. Acredito que vamos encontrar as impressões do Marcelo e de mais alguém.
– Eu estou perplexa com tudo isso. Como esses dois tiveram coragem de fazer isso com a vovó. Não gostar dela é uma coisa, agora fazer isso é monstruoso. E ainda tentaram me culpar. Dois assassinos nojentos, tomara que peguem muitos anos de cadeia. – falou ela.
– Ele com certeza vai pegar. Ela, por não ter participado diretamente da ação, se tiver um bom advogado deve conseguir uma pena menor. Mas, o caso deve dar uma grande repercussão, a imprensa vai fazer a festa com essa história e isso pode pesar contra eles. Isso também é comum, quanto mais a opinião pública ficar contra eles, pior na hora do julgamento.
– Bem que eles merecem. Ainda estou digerindo tudo isso, difícil acreditar, parece que é um pesadelo e vou acordar a qualquer momento.
– Você não acreditaria nas histórias que já vivenciei na polícia. Já presenciei coisa bem pior. – comentou ele.
– Eu ia adorar ouvir algumas dessas histórias. Aliás, agora que tudo acabou, você está me devendo uma revista. – disse ela rindo, estendendo a mão para ele.
Ricardo devolveu o gesto, esticando a mão para cumprimentá-la. O aperto de mão durou alguns segundos, tempo suficiente que ele sentisse toda a maciez da mão daquela jovem.
– Como você já tem meu número, vou aguardar seu contato e sua intimação. – falou ela sorrindo enquanto voltava para dentro do prédio.
Ricardo foi para a viatura, que estava na calçada, com Nando na direção.
– Ai, ai, ai, lá vem mais bomba. – falou Nando.
– Fica tranquilo que o caso já está resolvido. – brincou Ricardo enquanto verificava o número de Marcelle no telefone.
– Vamos nós para outra aventura. – sentenciou Ricardo.