É chegada a hora da verdade
14 – O cerco
Nando, Adauto e Renato, se aproximaram, ficando junto à porta, do lado oposto ao de Ricardo. Nesse momento Marcos chegava. Atraídos pelo barulho dos disparos, alguns vizinhos abriram as portas, mas ouviram os gritos dos policiais para que voltassem para dentro. Com cuidado Ricardo puxou a mulher para o corredor, tirando ela da linha de tiro. Ricardo fez um sinal para que os outros policiais esperassem.
– É melhor você se render ou vamos entrar. Você não vai ter nenhuma chance se nós entrarmos. – ele agachou e se esgueirou pelo canto da parede para poder olhar para dentro.
Nesse momento mais um tiro foi disparado para fora. Após o disparo, Renato pulou, atravessando para o lado em que Ricardo estava. Ricardo olhou para Nando, como que combinando a ação. Ele ainda estava agachado e desse jeito puxou parte do corpo para a porta e fez dois disparos. Numa fração de segundos Nando, que estava em pé, apareceu na porta, surpreendendo o homem que tentava se levantar, após ter se abaixado para se esconder dos tiros de Ricardo.
– Largue a arma. – gritou Nando.
O homem ficou parado, olhando para ele e, após um momento de reflexão, ergueu o braço, preparando-se para disparar a arma. Nando foi mais rápido e o homem foi atingido no braço, próximo ao ombro. Ele se jogou para dentro do quarto. Os policiais entraram no apartamento.
– Me cubram. – gritou Ricardo se aproximando da porta do quarto.
– Estou na porta. Tranquilo. – avisou Adauto, que se postou na entrada.
Ricardo se aproximou da porta do quarto. Renato deu uma rápida passada pelo apartamento.
– Não tem mais ninguém, ele está sozinho. – avisou.
Ricardo fez um sinal para que eles se posicionassem. Renato pediu que ele esperasse e saiu da sala. Logo depois voltou com um espelho que pegara no banheiro e passou para Ricardo. Ele posicionou o espelho de modo que eles pudessem ver o quarto e onde se encontrava o homem. Os policiais puderam ver que ele estava sentado no chão, encostado no armário. Ele sangrava muito, o tiro havia atingido o ombro.
Quando viu o espelho o homem fez mais disparos. Ricardo fez a contagem de três com os dedos, logo depois ouviu um estalo seco. Os outros dois policiais entenderam o sinal, o homem havia descarregado o revólver, que agora estava sem munição. Eles invadiram o quarto, ele estava sentado, com o corpo inclinado para o lado.
– Parece que acabou. – falou Ricardo enquanto chutava a arma do sujeito para longe.
– Parece. – disse o homem, tentando levantar o corpo.
– Já pedi a ambulância. – avisou Nando.
– Vai querer nos contar por que tudo isso enquanto esperamos pelo seu socorro? – perguntou Ricardo.
O homem encarou os policiais, o suor escorria pela testa. Estava se sentindo tonto, provavelmente por conta do sangue perdido.
– Que se foda, vão todos para o inferno. – disse ele, ajeitando o corpo como dava. Depois de alguns segundos, voltou a falar – Ela foi uma canalha comigo. Desde que veio morar aqui sempre a ajudei, fiz de tudo para agradá-la. Emprestei dinheiro, dei presentes. E como ela me pagou? Se tornou amante de um bosta qualquer. Nem namorado o sujeito era, tinha família e sempre deixava ela em segundo plano. E a sacana gostava disso. Ao invés de ficar comigo, preferia ser amante de um mané.
– O que aconteceu no sábado? – perguntou Ricardo.
– Eu tinha ido dar uma volta, estava retornando para casa quando vi a Suelen com seu amante. Eles pareciam estar vindo para o prédio. Foi quando o mendigo apareceu, saindo de um beco e foi para cima deles. Houve uma rápida discussão e eles seguiram em frente.
– Você os seguiu?
– Não, eu parei para falar com o mendigo, queria entender o que tinha acontecido, pois ele tinha chamado a Suelen pelo nome. Dei cinquenta reais na mão dele e ele ficou bem mais amistoso. Colocou o dinheiro numa caneca e começamos a conversar. Foi então que ele falou que era irmão dela, que tinha vindo de Pernambuco para cá pois estava na miséria e achava que ia arrumar dinheiro com a irmã de qualquer jeito ou iria infernizar a vida dela.
O homem teve um acesso de tosse. Renato tinha arrumado uns pedaços de pano para fazer uma atadura e tentar estancar o sangue.
– Então você matou o mendigo? – perguntou Ricardo.
– Claro. Precisava protegê-la. Esse bosta aparece do nada para infernizar a vida da Suelen, sem chance. Mantive a conversa, fingindo concordar com ele, nisso deixei cair umas moedas e umas notas de dois reais. Ele se abaixou para pegar o dinheiro. Fui rápido quando ele se levantou. Dei a gravata e arrastei ele para dentro do beco, que é muito mal iluminado.
– Você é mais alto e mais forte do que ele, não deve ter sido difícil, em minutos estava tudo acabado, certo? – comentou Ricardo.
– Foi isso mesmo. Pequei meus cinquenta reais de volta, já que ele não ia mais precisar do dinheiro e fui para casa.
– Mas, e a Suelen? – perguntou Nando.
– Foi uma decisão ali no momento, foi o acaso, não tinha pensado em matá-la. Depois que resolvi o problema do irmão para ela, voltei para o prédio. Vi quando o amante foi embora. Subi e fui falar com ela. Disse que tinha visto a discussão deles com o mendigo e perguntei o que estava acontecendo, se ela estava precisando de ajuda. Falei que ela podia contar comigo que eu a protegeria. Se ela confiasse em mim eu resolveria tudo. Falei que ela não precisaria mais se preocupar com o irmão. Achei que ela entenderia e ficaria grata.
– O que ela fez?
– Ela se assustou quando eu falei do irmão, quis saber como eu sabia e o que tinha feito com ele. Eu disse que tinha dado um susto nele e que ela não precisava mais se preocupar pois ele não voltaria a incomodá-la.
– E por que matá-la? – quis saber Ricardo.
– Por quê? – perguntou ele olhando para o policial – Eu disse para vocês que sempre fiz tudo por ela. Tinha acabado de matar um homem para protegê-la e sabe o que ela disse? Que não precisava de mim para nada, que sabia se defender sozinha, que não adiantava eu ficar atrás dela, pois eu não ia conseguir nada. E falou rindo, com a maior tranquilidade. Filha da puta ingrata. Fiz de tudo por ela, até matar, e ela me despreza desse jeito. Se ela não ia ser minha, não seria de mais ninguém, foi nessa hora que tomei minha decisão. Foi mais fácil do que matar o irmão.
Nesse momento o socorro chegava.
– É seu Robson. Acho que acabou para o senhor também. – falou Ricardo se afastando para que a equipe médica pudesse agir.
O síndico não falou mais nada, apenas levantou a cabeça olhando para o teto. Uma lágrima escorreu pelo canto do olho. Ricardo não sabia se era de arrependimento por ter matado a mulher que gostava ou de ódio pela forma como ela o tratou. O homem foi levado para o Hospital Miguel Couto, devidamente escoltado.